Desculpa, mãe...
Oi mãe, hoje eu voltei pra casa cedo, tenho
um trabalho novo, amanhã vou começar.
Sabe mãe, eu tô tão confiante, meus estudos vou
pagar e a nossa vida vou mudar.
Ah mãe, eu também gosto de funk, é um ritmo empolgante,
faz as pernas se “agitar”.
Isso é ruim, mãe?
Ô mãe, hoje eu não vou voltar pra casa,
não fica chateada, minha alma
foi roubada, e não tem devolução.
Sabe mãe, eu nunca pensei que a cor da
minha pele, o bairro que eu moro e o meu jeito de falar,
fossem um dia me sentenciar.
Hoje mãe, eu deixo de ser sonho para me tornar estatística
Mãe, "se eu fosse o rei de um grande regimento,
eu colocaria flores nos rifles, e todos atirariam
pétalas no lugar de fogo." E aí, mãe, no coração das pessoas ia florir todo
o amor que falta neste mundo.
Ah mãe, não se esqueça de avisar para
meus amigos que eu era um garoto Feliz.
Mãe, mesmo que nenhuma bandeira
seja por mim levantada, eu não quero ser esquecido.
Lembre-se de mim sempre que um menino descalço, de
pele escura por você passar.
Diga a ele algo bem simples que eu
sempre gostei de escutar:
- Ei moleque, você ainda vai ser um grande
homem!
Pronto, está aí o combustível pra eu “muleque”
sonhar.
Ô mãe, por que não quiseram acreditar?
O homem grande não deixou eu crescer, bombardeou
meu peito com ódio e preconceito. Mãe, quem deu a eles esse
direito?
Mas ei mãe, não chora não...
Que o sangue inocente que foi derramado regue o
coração de outros jovens como eu, e faça nascer revigorada
a esperança esquartejada.
Se alguém perguntar por mim, mãe, diga
que apesar de tudo eu acreditava.
Mãe, não se vista de luto, não. Coloque a cor da
nossa bandeira no seu perfil.
Eu aprendi que nas
tragédias as pessoas se vestem de pátria.
É sinônimo de amor, né mãe?
É sinônimo de amor, né mãe?
Sabe mãe, eu acho que frio eu nunca mais
vou passar. Sabe por quê?
Porque o seu coração é a casa mais
quentinha que eu conheço, e é nele que a partir de hoje eu
vou morar.
Tchau mãe.
Desculpa, mãe...
(arte: Felipe Guga /@ofelipeguga)
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